- Por sindiproladuel
- postado em 8 de abril 2024
- em Boletins
Para a administração pública, o saber científico (econômico, estatístico, administrativo, jurídico etc.) não é uma opção qualquer num leque de possibilidades nos modos de conhecimento da realidade, mas um componente fundamental de suas decisões e ações. Decerto, as decisões e finalidades governamentais não são de natureza meramente científica; ao contrário, são prioritariamente políticas. Isso não significa, porém, que o conhecimento científico seja supérfluo, visto que todas as decisões governamentais envolvem a perspectiva de implementação de políticas públicas também conforme preceitos de eficiência, escopo, economia de gastos etc.
No documento Receitas públicas: manual de procedimentos (2007) – procedimentos que devem ser aplicados à União, aos estados, ao Distrito federal e aos municípios –, lê-se o seguinte: “com o objetivo de obter uma previsão de receitas cada vez mais próxima da realidade e, consequentemente, um adequado planejamento governamental, inclui-se nesta edição um capítulo que trata da metodologia de projeção de receitas” (p.13). E mais, “a projeção das receitas é fundamental na determinação das despesas, pois é a base para a fixação destas na Lei Orçamentária Anual, na execução do orçamento e para a determinação das necessidades de financiamento do Governo” (p. 30). Ou seja, “na fixação das despesas no Projeto de Lei Orçamentária Anual, a dotação orçamentária depende da previsão da arrecadação. Dessa forma, a Lei fixa os gastos orçamentários como função da receita prevista” (p. 95).
No manual Introdução ao orçamento público, da Escola Nacional de Administração Pública – Enap, diz-se que “a credibilidade do orçamento depende do critério com que se elabora a estimativa de receita” (2017, p. 18). Isso porque superestimar ou subestimar a previsão de receitas prejudica a execução orçamentária e, portanto, a qualidade do gasto do dinheiro público. No caso das universidades, a subestimação orçamentária dificulta a elaboração de projetos de médio e longo prazos, pois não há confiabilidade no fluxo das receitas em razão da discrepância entre a previsão e a arrecadação real. Geralmente, essa previsão de receita em montante menor do que a receita efetiva demanda permanente solicitação de suplementação orçamentária, fomentando gastos reativos, ad hoc etc. Essa situação seria muito diferente se a previsão orçamentária fosse mais fidedigna e os recursos fossem enviados sob a forma de duodécimos. Diante disso, conforme critérios elementares de cientificidade na administração pública, como podemos qualificar a previsão orçamentária dos governos do estado do Paraná? Vejamos o gráfico abaixo.
De acordo com os dados apresentados, os últimos governos do Paraná têm tido dificuldades na capacidade de projeção das receitas ou, então, manipulado as informações orçamentárias para finalidades políticas?
Vemos que, nos mandatos do Beto Richa, houve sistemática superestimação orçamentária, com as receitas variando de 91,02% (2013) a 99,19% (2011) da previsão contida na LOA, sendo que a enorme atipicidade de 2013 teve como motivo a eclosão da crise econômica. Uma das consequências dessa política era a efetivação de recorrentes cortes orçamentários para o ajuste das despesas em relação às receitas.
No caso de Ratinho Jr., houve uma drástica inversão da situação anterior, com a receita ultrapassando largamente a previsão orçamentária. No segundo ano do primeiro mandato (2019-2022) – ou seja, o primeiro ano governando com a LOA elaborada pela sua base parlamentar (a execução do orçamento de 2020) –, as receitas ultrapassaram em 4,72% a previsão orçamentária. No ano seguinte, em 19,26%. Em 2022, a arrecadação excedeu incríveis 26,7% em relação ao previsto. Em 2023, excedeu 25,73%. Isso, porém, não ocorreu por um crescimento extraordinário da economia e das receitas, mas pela deliberada subestimação de receita no momento da elaboração da LOA.
Previsão receita LOA (em bilhões de R$ – valores nominais) | Previsão receita LOA (em bilhões de R$ – valores nominais) | Previsão x receita (%) | |
---|---|---|---|
2010 | 23,577 | 22,199 | 94,2% |
2011 | 25,303 | 25,098 | 99,2% |
2012 | 29,688 | 27,832 | 93,7% |
2013 | 35,315 | 32,142 | 91,0% |
2014 | 37,205 | 35,762 | 96,1% |
2015 | 41,167 | 38,896 | 94,5% |
2016 | 44,184 | 43,680 | 98,9% |
2017 | 47,020 | 46,378 | 98,6% |
2018 | 56,176 | 51,382 | 91,5% |
2019 | 54,239 | 52,404 | 96,6% |
2020 | 46,257 | 48,439 | 104,7% |
2021 | 47,134 | 56,214 | 119,3% |
2022 | 50,877 | 64,462 | 126,7% |
2023 | 56,645 | 71,218 | 125,7% |
Esses números poderiam demonstrar que estamos diante de uma situação de clara inépcia administrativa do governo estadual, que não teria à sua disposição equipe técnica qualificada para o exercício de um procedimento básico da administração pública – a projeção orçamentária. Mas, claro, por maiores que sejam as discordâncias que temos com a Sefa, sabemos que não é isso. Os números, na verdade, indicam uma estratégia deliberada de manipulação de dados do orçamento com a finalidade de desqualificar as justas demandas do funcionalismo público pela recomposição inflacionária de seus salários e a necessária adequação de salários de certas categorias. Conforme cálculos do economista Cid Cordeiro, os gastos com os salários do funcionalismo público em 2023 (43,23%) ficaram bem abaixo tanto do limite legal (49%) quanto do prudencial (46,55%). Portanto, os dados subdimensionados demonstram a orientação contrária à recomposição salarial dos funcionários públicos prevalecente no governo do estado do Paraná.
De nossa parte, sabemos que a recomposição dos salários conforme a inflação e a valorização das carreiras são direitos dos trabalhadores. E, a despeito da situação fiscal, o governo deve buscar todos os meios para fazê-las, seja por meio da redistribuição interna dos recursos orçamentários – dentro dos parâmetros legais –, diminuindo ou eliminando a renúncia fiscal (que, como sabemos, se eleva a um valor anual equivalente a quase 25% do orçamento do estado) ou, se necessário, buscando fontes complementares de receita.
Sendo assim, exortamos todos os segmentos do funcionalismo público a ficarem atentos às práticas políticas que visam à desqualificação das lutas da categoria e, ao mesmo tempo, a manterem a organização para a mobilização necessária com vistas à defesa dos salários e direitos trabalhistas da categoria.