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Entrevista com Ariovaldo Santos sobre o Movimento Sindical no Brasil

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1. Como analisa a atual situação do movimento sindical no país? Bom, em certo sentido a situação do movimento sindical no país se expressa pela ausência que o mesmo tem demonstrado no que concerne à agenda nacional. Nos anos 1980, quando da fundação da Central Única dos Trabalhadores, o movimento sindical inspirava medo, pela sua capacidade organizativa e bandeiras que se contrapunham à ordem capitalista, ainda que o limite fosse a defesa do socialismo. Entretanto, no transcurso dos anos 1990 a tendência da CUT foi a de enfileirar-se no bloco comum do sindicalismo de concertação social ou propositivo, confirmando tendência já presente no sindicalismo europeu do pós Segunda Guerra Mundial. Com isto, a ordem burguesa passou mais à condição de parceira do que de opositora aos interesses do trabalho. A guinda operada pela CUT, sobretudo a partir de seus 3º Congresso, no final dos anos 1980, esteve na origem da saída, posteriormente, de vários de seus militantes que, embora mantendo o necessário radicalismo, no sentido de construção de um projeto próprio, não lograram obter a penetração de massa que dispunha a CUT em seus primeiros momentos e que, em certo sentido, mantém ainda agora. Basta ver que diante da eclosão da crise de 2008 nenhuma bandeira de greve geral foi levantada ou efetivada. Pelo menos nenhuma proposta séria colocou-se no horizonte. Discursivamente, tem-se a impressão de que o movimento sindical está na ofensiva. É suficiente ler um jornal da CONLUTAS, por exemplo. Porém, na prática, ele passa por uma crise profunda no sentido de que, de um lado, mal consegue defender os trabalhadores que estão na economia chamada formal e, de outro, assistem à erosão de sua credibilidade real junto àqueles que compõem a força-de-trabalho assalariada. O abandono pelos sindicatos de uma efetiva política de base contribui para isso. Mas contribui, também, a transformação de excelentes lideranças em parlamentares sem, contudo, realizarem, nesta condição, o trabalho que se deveria esperar deles dentro de uma política de organização da classe. Passam a ser muito mais corresponsáveis pelo referendar das políticas públicas propostas em vez de correia de transmissão para a organização do movimento popular como apontavam, no século XIX, Marx e Engels. 2) Que mudanças foram trazidas no plano sindical com a proposta de reforma do Governo Lula? O Governo Lula começou com uma tentativa de Reforma Trabalhista que somente acentuou o que já estava em curso, isto é, a adesão dos sindicalistas ditos combativos ao Aparelho Ideológico de Estado. O Fórum Nacional do Trabalho é um exemplo disto. Discutiu-se por meses a modernização das relações de trabalho no Brasil, o que, na prática, queria mais dizer o seguinte: como é que o capitalismo brasileiro pode acompanhar o movimento de globalização das economias. Basta ver, por exemplo, na redação final do documento que as entidades que participaram, por não contarem com o referendo e a participação efetiva de suas bases, não lograram acabar, entre outros pontos, com a criminalização do movimento sindical em caso da realização de uma greve. No fundo, um instrumento muito usado pelas políticas neoliberais continua de pé dentro do documento. A mesma coisa é possível de se dizer em relação à organização nos locais de trabalho, que conta com a resistência do patronato. O que as entidades sindicais ignoram, propositadamente ou por limite de consciência mesmo, é que o fórum não foi organizado para representar os interesses dos trabalhadores e sim aqueles da acumulação capitalista no país. Mesmo assim, poderiam ter logrado conquistas no documento final. Porém, como se tratou de uma discussão pelo alto e não pela base, a força para impor uma agenda saiu enfraquecida.  3) Como explicar o fenômeno da estatização e burocratização dos sindicatos? Preferiria recorrer ao termo mais apropriado, que é o de institucionalização e não ao de estatização dos sindicatos, sobretudo porque se trata de um processo mais amplo, de caráter mundial. Na discussão sobre estatização esta presente o debate muito freqüente, no Brasil, de que aqui a estrutura de sindicatos únicos, aqueles por bases territoriais, contrastam com a estrutura sindical de outros países, onde reinaria a liberdade sindical e que tornaria estes sindicatos, por conseqüência, mais fortes. Já no caso da institucionalização estamos diante de um fenômeno que foi acompanhando a constituição da organização sindical. Mais ele se mostrava ofensivo, maior foi o esforço para compartimentá-lo dentro da esfera jurídica. Somente esta pergunta ancoraria uma palestra ou curso de formação, mas é importante dizer que, a partir do momento em que a organização sindical está compelida a lutar contra os donos do capital ou contra o patrão direto, precisa lidar com determinadas situações. Em primeiro lugar, entender o próprio ordenamento jurídico, o que empurra as organizações, muitas vezes, a fiarem-se mais nos advogados do que na própria capacidade de mobilização da categoria. De outra parte, fazer a luta, requer fundos financeiros, o que acabou jogando as organizações sindicais e as próprias Centrais para o terreno do capital financeiro, como analisou muito bem João Bernardo em Capital, Gestores e Sindicatos, mas também em publicação mais recente chamada Capitalismo Sindical. Claro que quanto maior a burocratização dos sindicatos maior é o distanciamento em relação à organização de base. Contudo, se esta foi e tem sido uma tendência, é importante verificar, também, o nascimento de iniciativas contrárias ao sindicato de burocratas, como é o caso dos Comitês de Base, na Itália e das Coordenações, na França.  4) Qual o papel do movimento docente no interior do movimento sindical? Bom, qualquer mobilização de trabalhadores é de relevância. Contudo, o movimento docente contém especificidades, por ser eminentemente uma luta muito mais marcada ideologicamente pelos referenciais pequeno-burgueses do que proletários, no sentido clássico da palavra. Este fenômeno é mais marcante ainda nas Universidades Públicas, que nos coloca em uma condição na qual, efetivamente, não permite que sejamos parte do proletariado. De qualquer modo, enquanto parte dos trabalhadores assalariados, o movimento docente, quando eclode, entra em greve, para as aulas, revela que, independente dos salários, existe política de arrocho salarial e de precarização das condições de trabalho, também, junto a este contingente de indivíduos.

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